Conto: A Confiança
- Jonathan Priantti
- 13 de out. de 2015
- 5 min de leitura
(Conto de autoria do aluno)
Como a célebre frase de Horácio perpetua o tempo ainda havia uma doce e determinada mulher que o acreditava: “Quem tem confiança em si próprio comanda os outros”, essa frase praticamente determinava o modo de viver de Tarcísia uma burguesa da classe média/alta dissimulada pelos padrões de vida dos comerciantes burgueses. Todo dia ela voltava do comércio de sua família para casa à tardina e andava duas, três ruas a mais na cidade só para passar em frente da casa de seu prazer, Amnon, homem de poste físico singular e rosto endeusado, filho de Judeus, porém não judeu, e também doutorado em engenharia. Pela confiança que tinha, Tarcísia não precisava saber nada mais que o que foi descrito acima para se atirar nos braços de Amnon e casar-se com ele, com o único pensamento de usufruir de toda sua beleza. Enfim! Casaram-se!
Os dias entre eles cresciam e em Amnon a chama que ele sentia desde o primeiro ver dele a Tarcísia apenas aumentava como um fogo que abrasa, que consome, porém em Tarcísia só crescia o prazer de tê-lo – Ah!, esqueci, Amnon morava em sua casa junto com seu primo, Agnes, moço pacato e segundo a vizinhança muito afeminado que exercia a medicina há cerca de três anos.
Agora, o repetir da vida de Tarcísia ganhava uma adição matrimonial, Amnon. Todo dia quando ela voltava do trabalho, ele já estava na casa dela, pois ambos ainda moravam em casas separadas, porém uma casa bem perto da outra. Tarcísia não tinha amigos nem muitos parentes, ia para festas perto de sua casa apenas para comer e tão pouco pensava em se divertir, era praticamente um ser isolado em meio a um bairro tão grande. Todos a conheciam somente por ela ser caixa no comércio, que era o único da localidade, - Bom dia!, - Obrigada!, - Volte sempre!, - Gostei do cabelo!, - Tchau!, - Oh, que criancinha tão fofa! Todos estes eram diálogos sempre pertinentes e também repetitivos em seu atendimento, afinal ela era uma boa moça e pelo visto muito bem- educada pelos seus pais, casal de professores que haviam morrido um ano antes do casamento de Tarcísia com Amnon. Enfim! Sempre tinha alguma palavra educada para falar para sua clientela, porém certo dia essa educação foi riscada por um silêncio fingido, um silêncio fingido que abrangia a perplexidade da notícia vinda por uma cliente, dona Clotilde, moça que ganhava cerca de cinquenta mil réis por mês apenas por talvez saber tudo de todos – Que trabalho digno, hein! Voltando ao caso, se ela sabia tudo de todos, logo Amnon não escapava das garras da fofoqueira, a qual exercia seu trabalho com muito fulgor. Voltando ao caso novamente, dona Clotilde, ao finalizar sua compra perguntou a Tarcísia:
- Você gostaria de saber algo que descobri sobre seu marido?
Tarcísia, com olhar sereno e ao mesmo tempo sério, queria saber, mas não saber a notícia, mas o que ela iria inventar, afinal, todos, até ela, já sabiam da profissão de dona Clotilde. Tarcísia, inventou um olhar curioso, tirou 50 réis do caixa, afinal ela era riquíssima, e disse, colocando o dinheiro sobre as mãos da fofoqueira:
- Conte-me logo! Então, a senhora disse:
- Seu marido não é quem ele finge ser! Digo, ele não gosta de mulheres! Todo dia ele recebe homens, por sinal, muito bonitos e iguais a ele na casa dele, mas pelo visto você nunca iria desconfiar, não é mesmo?! Afinal, ele é seu brinquedo só na sua casa, se duvidar você só sabe o nome dele!
Para você, leitor, talvez seja engraçado, claro, se estiver no meu tempo, mas caso esteja no futuro talvez seja normal receber uma notícia assim, pois o mundo tende e tarda a mudar. Mas é claro, como ela estava no meu tempo Tarcísia riu, riu mesmo, riu muito, rio a volonté!
Nesse mesmo dia, Tarcísia fechou o comércio na hora de costume, às oito da noite, e se dirigiu a casa de Amnon, talvez ela tenha pensado que realmente se casou com alguém que só sabia o nome... enfim! Ela andou duas, três ruas e quando virou a esquina da Rua dos Ourives, bem próximo à casa de seu marido, viu um homem so gourgeous e bem vestido saindo da casa de Amnon. Já na porta, o homem se virou como se fosse abraçar alguém, mas o homem demorou um pouco, o problema que não se sabia se ele estava abraçando alguém, porque ela só tinha a visão do lado de fora da porta e dessa visão só dava para ver as pernas do homem pois seu busto estava para dentro da porta, dessa visão embaraçosa muita coisa se podia imaginar, inclusive a história de dona Clotilde – Porque não? Daí, começaram a surgir pensamentos que Tarcísia mesma duvidara pensar, ela já estava planejando contar a história de dona Clotilde para ele rir – Ah lembrei, foi por isso que ela foi para casa dele. Enfim! Ela esperou na esquina até o moço ir embora, viu que ele entrou em uma casa próxima. Então, ela se dirigiu a casa de Amnon e tocou a campainha. Logo ele atendeu, e...
Ó leitor, acho que estás curioso com o decorrer da narrativa, talvez. Mas o que custa ler uma brevíssima reflexão? Talvez você esteja se perguntando porque ela ficou se importou se não o amava, na verdade, um resquício de amor havia sim, afinal ela sendo uma leitora fútil do Romantismo, não destoaria em desilusão muito menos em possessão e ciúme. Além disso, ela, horaciana, teve seu ser invadido por Horácio: “A adversidade desperta em nós capacidades que, em circunstâncias favoráveis, teriam ficado adormecidas”. Essa capacidade, meu caro leitor, foi a desconfiança. Ah! Reflexões não prestam!
Ele atendeu e ela começou a ver nele manchas vermelhas ao redor de seu pescoço, manchas bem vivas e humanas, a partir daí o olhar sereno de Tarcísia foi substituído por um olhar fixo e sua atitude doce por um escrúpulo estranho, tudo bem ele não desconfiou de nada, imaginava apenas que ela estava com problemas na loja e em nada ele poderia intervir, ela, no entanto, tinha uma ideia pulando, fazendo os mais altos e perigosos saltos acrobáticos no trapézio de seu cérebro. Ela entrou, eles se cumprimentaram, jantaram, tudo em um tom muito estranho a normalidade. Ele, cansado, decidiu dormir e antes de ir para cama deu um beijo na testa de Tarcísia, que estava sentada à mesa com pensamento oblíquo e psicótico, porém não dissimulado.
No dia seguinte, Amnon acordou pelos berros da multidão, a rua estava completamente ensanguentada e em linha reta havia um pequeno caminho de sangue que levava até um lugar obscuro, ele foi até ele e encontrou escrito: “A cólera é uma breve loucura”. Em baixo do escrito lá estava um facão e ela, morta, toda ensanguentada e cortada, Tarcísia, que pelo visto realmente seguiu Horácio até mesmo para vida eterna. Nessa cena, todos, inclusive Amon e Agnes, estavam perplexos, mas Amnon, com todo o amor e a cumplicidade de um bom marido, pegou do sangue escorrido da mesma e escreveu com tom de ordem: Carpe diem! Agnes começou a chorar desesperado com tom de tristeza, pois seu namorado, que morava bem próximo a ele, também estava morto ao lado dela. Agora, Agnes e Amnon se tornaram horacianos: “A duração breve da nossa vida proíbe-nos de alimentar uma esperança longa”.
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